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Mulher de Vitórias – Sarah Ipiranga, Professora de Literatura |  @sarahdivaipiranga

 

Sarah Ipiranga é uma Mulher de Vitórias, cuja trajetória se entrelaça profundamente com a educação, a literatura e o amor pela cultura brasileira. Doutora em Educação Brasileira, cearense de alma e coração, é professora de Literatura em Língua Portuguesa e Literatura Comparada, escritora, palestrante e pesquisadora incansável. Mesmo aposentada da sala de aula tradicional, continua ativa na promoção do conhecimento e da leitura crítica, desenvolvendo projetos autorais e participando de seminários, como o que recentemente organizou na XV Bienal do Livro do Ceará, onde atuou como curadora. Uma de suas paixões é o romance “Iracema”, de José de Alencar, que inspira estudos, minicursos e a criação de novas narrativas, como o futuro romance “A volta de Moacir” e o projeto “Expedição Iracema: saberes, territórios, palavras”. Serena e firme, Sarah se descreve como alguém de braços dados com a vida – movida por laços de família, amizades verdadeiras e o prazer das pequenas coisas. Para ela, o estudo é mais do que acúmulo de conhecimento: é uma prática de aprimoramento da mente e do espírito. Entre livros desde a infância, encontrou na leitura um espaço de liberdade, reflexão e conexão com o mundo. Tem na educação um compromisso vital e acredita que o poder de escolha e de compartilhar saberes é uma das formas mais verdadeiras de empoderamento. Caminha pela cidade com curiosidade e carinho, ouve com atenção o corpo e as pessoas, e vive com a fé na bondade e na harmonia do universo. Sarah é uma amante da beleza que habita as coisas simples. Em cada palestra, em cada texto ou conversa, busca tocar as pessoas com aquilo que acredita profundamente: que o amor, a escuta e o sorriso são caminhos de transformação.

O que você pode nos falar sobre você, Sarah?

Bem, considero-me serena, firme e de braços dados com a vida: família, amigos, livros… Não sou muito de falar de mim, perdão!. Escorpiana, mãe, professora, escritora – são muitas as identidades e tento conviver bem com cada uma delas.

Qual a importância dos estudos e dos livros na sua vida?

Estudar sempre foi uma meta na minha vida, aliás, aprender. É um dos lugares que mais amo: a aprendizagem. Estar com um livro e estudar as vidas que moram ali são dois grandes prazeres. Deve-se dizer, entretanto, que o estudo só tem sentido se acrescentar verdadeira formação, ou seja, aprimoramento da mente e do espírito. Vivi entre livros a maior parte da minha, desde a biblioteca da minha mãe, à que eu mesma construí. Depois passei a conviver com os livros das minhas filhas e as estantes ficaram pequenas para tantas obras. Enfim, a leitura não é adorno aqui em casa, é fluxo de ideias e emoções.

Qual é a sua profissão?

Acho que nasci professora, pois dar aula, para mim, é tão natural como comer ou dormir. Tenho até que tomar cuidado para não ficar dando lição por aí. Embora já aposentada, mantenho com o ensino uma relação de gratidão: ele me deu tudo! Deu-me um mundo de ideias, viagens, aprendizagens, desencontros também, afinal, às vezes é na contracorrente que aprendemos a nadar. E essa profissão também me ensinou o valor do aprender e por isso sempre estou estudando, aprendendo coisas novas, como o curso de Inglês que ora faço no Senac.

E qual é o seu passatempo favorito?

O melhor passatempo é o que o próprio nome encarna: passar o tempo sorvendo a vida, contemplando a paisagem. Mas, vivente da cidade, aproveito para caminhar pelas ruas, conversar com as pessoas, brincar com meu cachorro, Loki, e passar o tempo junto das mínimas coisas que são tão valiosas.

Você é uma mulher de muitas amizades?

Mantenho bons círculos de convivência: eles renovam minha energia e são uma excelente fonte de divertimento também. Há o grupo de amigas do colégio onde estudei e que se encontra até hoje (Colégio 7 de Setembro), amigos professores da Universidade, ex-alunos que viraram grandes amigos etc. Quero nomear duas grandes amigas: Ana Lúcia e Luíza. A primeira, Aninha, como eu a chamo, conheço desde os sete anos de idade, quando estudávamos no Colégio Rosa Gattorno, escola que foi um marco da educação na minha vida, e a segunda, a Lulu, conheci no 7 de Setembro, onde fui fazer o científico, como se chamava na época o Ensino Médio. Com elas atravessei os anos e mantemos hoje uma fraternidade que nos torna irmãs.

Fale-nos sobre a sua família.

Com as minhas filhas – Mariana, Ana Cecília e Joana – tenho tudo e isso me basta. Sou absolutamente feliz com a presença delas. E meus irmãos são o braço firme e caloroso que ressignifica nossa ascendência: Jamille, Sávio e Pedro. Enfim, família é o melhor onde se pode ficar.

Você deposita sua fé em que?

Tenho fé na harmonia do Universo e, sobretudo, na bondade. Pode parecer um lugar comum, mas o Amor é o único caminho. E tenho minhas devoções também: Santo Antônio é um exemplo para mim de fé, estudo e dedicação. Vamos ouvir uma música! Mais tarde eu falo sobre ela!

Ouvi dizer que você conhece bem Iracema, de José de Alencar. Isso é verdade?

Tenho muitos projetos ainda para avançar na vida (e já desenvolvi tantos, às vezes só quero mesmo o meu projeto principal: minha rede, minha vida), mas, neste momento, há uma pesquisa em especial que me renova a paixão: o estudo do romance Iracema, de José de Alencar. Acabei de organizar um seminário na XV Bienal do Livro do Ceará, na qual fui uma das curadoras, sobre o romance a partir de uma visão bem contemporânea. Projetos futuros em relação a ele: uma residência artística, leia-se um tempo afastada, para escrever o romance A Volta de Moacir. E divulgar mais ainda essa obra com o projeto Expedição Iracema: saberes, territórios, palavras.

Iracema de Alexandre Uchoa, Fortaleza, 2009

Na orla poética da Praia do Mucuripe, onde as jangadas riscam o mar com suas velas ao vento, ergue-se uma escultura que eterniza um dos mais belos mitos de origem do Ceará: o amor entre Iracema e Martim Soares Moreno. Inspirada no clássico romance Iracema, de José de Alencar, a obra retrata a jovem indígena, símbolo da terra virgem e ancestral, ao lado de seu amado português e do fiel cão Japi. Mais do que uma representação escultórica, a peça inaugurada em 24 de junho de 1965 — e assinada pelo artista pernambucano Corbiniano Lins — é um delicado tributo à fusão de mundos, raças e afetos. Com sua presença serena e poderosa, a estátua se harmoniza com o cenário natural de Mucuripe — lugar onde o mar se encontra com a história e onde o sopro dos ventos parece ainda ecoar as palavras doces do romance: “virgem dos lábios de mel e dos cabelos mais negros que a asa da graúna”. Um ponto de visita obrigatória para quem deseja sentir a alma lírica do Ceará.

Como é a sua relação com palestras?

De certa forma, as palestras são uma sala de aula ampliada, em que fazemos chegar a um número maior de pessoas conhecimentos que nos movem e nos formam. Sou bem demandada nesse aspecto: acabei de chegar de Tianguá, onde fui dar uma palestra no IFCE. As trocas são muito boas e parece que eu sempre tenho algo a dizer para alguém que está esperando ouvir algo que tenha sentido para ele. Por exemplo, em Tianguá, além da palestra, dei um minicurso sobre Iracema, personagem que nasceu na Serra da Ibiapaba. Depois do evento, muitos alunos me procuraram para mostrar o livro que haviam pegado na Biblioteca: Iracema! Isso é muito motivador!

Lançamento do livro Coisas de Sala de Aula

O que falar do Ceará, do Brasil?

Amo o meu país, com suas belezas e mazelas. Há tanto encanto, como também desencanto. Mas aqui é o meu lugar, a minha paisagem interior, cuja alma se alegra ao ver o sertão e o mar. A força da natureza no nosso país aliada à generosidade das pessoas faz desse canto uma nação.

E como vai a sua saúde?

Vejo o corpo como um transporte etéreo, uma manifestação da vida que me foi dada. Assim, cuido dele como se cada órgão tivesse um sentido e precise ser protegido. Quando adoeço, lembro do que minha médica, que me acompanha há mais de vinte anos, sempre me diz: a melhor resposta é a pergunta. Então pergunto ao corpo por que ele dói e fico calmamente a esperar a resposta. E ela vem, pode ter certeza!

Sarah é uma amante da beleza e da riqueza que habita as coisas simples.

E  a vida? E a vida o que é? Diga lá!

Vida é a única certeza que temos, pois ela está nas nossas mãos. Vida é o presente que construímos a cada dia.

Você tem sonhos?

Uma casa na praia com vista do mar e barulho das ondas. Perto do mar, me sinto mais próxima de mim mesma, da minha identidade e da liberdade. Na praia, precisamos de tão pouco: poucas ações, poucas roupas, poucos  adereções; e ganhamos tanta coisa: silêncio, amplidão, relaxamento. Desejo esse lugar de descanso, de reconexão e também de… trabalho. Sim, pois pretendo ter essa casa para poder escrever com tranquilidade.

“Perto do mar, me sinto mais próxima de mim mesma.”

Fale-nos sobre o “amor”.

Como falei anteriormente, acredito que esse seja o sentimento que areja e mantém o mundo. É importante, então, vivê-lo nas suas várias manifestações: o amor ao próximo, à família…

O que é poder? Como você o exerce?

Poder de escolha – esse eu gosto de exercer; poder para ajudar também. A liberdade é o que nos dá esse poder: escolher o que é melhor para nós.

Você tem medo de quê?

Medo do medo, pois ele nos paralisa. Acredito na aventura, na descoberta de novos caminhos sempre. Então espírito aberto: lembro da história Chapeuzinho Amarelo, do Chico Buarque, das melhores que li sobre a necessidade de educar sem medo. Nela, uma criança, de tão educada a partir de coerções, fica amarela de medo e não consegue fazer coisas simples: como brincar, passear etc. Está paralisada pelo medo. De forma bem divertida, o autor traz a figura do lobo mau para perto dela e somente olhando de frente para ele é que ela perde o medo do lobo e volta a ter uma vida liberta.

“Uma aventura é sempre bem-vinda: sair da terra e visitar o ar”, diz Sarah.

E o que o futuro traz?

O futuro é hoje! O futuro só existe com uma dia bem vivido – e uma boa noite de sono. Assim podemos abrir as portas para o vindouro.

Isso me lembra a palavra “empoderamento”. O que ela lhe diz?

Agarrar a si mesmo com vigor e crença, acreditar em si e nos seus valores, principalmente para nós, mulheres, historicamente destituídas de poder. Poder contar a nossa história, a partir do nosso lugar. Estive, neste ano, como curadora da XV Bienal Internacional do Livro do Ceará, cujo tema foi justamente Das fogueiras ao fogo das palavras: mulheres, resistência e literatura. Procuramos construir um evento com destaque para a produção feminina, empoderar as mulheres nas suas diversas formas de escrita. E foi simplesmente maravilhoso!

Palestra IFCE, Tianguá 2025

E o que é o sucesso para você?

A trajetória que empreendi na minha vida: sair daqui logo após a faculdade e ir estudar fora. Viver numa outra cidade e lá conquistar meu lugar. Voltar e dar curso a minha vida como professora universitária e cuidar da minha família. Isso para mim é sucesso: inteireza, dedicação, ser uma boa referência no que eu faço. E com projetos futuros: estou montando uma empresa de consultoria educacional com duas amigas: a Ímpares. Enfim, a vida se renova em cada projeto que sonhamos e construímos. O maior sucesso pra mim é o sorriso; quando sorrio é sinal de que deu certo. Nesse mundo tão confuso, isso é poder, sucesso, júbilo, alegria. Se sorrio, é porque não tenho medo, cheguei ou estou num bom lugar.

A quem você deve maior gratidão?

À minha mãe e ao meu pai – Maria Aparecida e Pedro Ipiranga; eles me trouxeram até aqui, e, no tempo deles, tudo era mais difícil, então respeitar esse esforço e dar continuidade a eles é minha forma de agradecer. Meu pai, o mantenedor, como cabia bem ao tempo dele; minha mãe, a formadora, mulher que me transmitiu o amor ao estudo. Tem um exemplo bem claro desses papeis num ambiente ainda bem conservador. Mamãe sempre contava que de duas coisas ela não abria mão da escolha: o nome dos filhos e o colégio onde eles estudariam. E meu pai que cuidasse de colocar em prática. Isso foi essencial nas nossas vidas.

O que você quer que as pessoas assimilem desta entrevista?

Pergunta difícil, mesmo para uma professora! Mas o sentimento de conversar com coluna foi de muita satisfação, então, se , ao final da leitura, houver um sorriso no leitor, a missão se cumpriu. Uma história simples, de alguém que acredita na vitória de estar vivo, construir um mundo melhor com os livros e a educação. Termino com um sorriso… Então é sinal de que fiquei feliz falando com você.

Existe uma música que lhe seja significativa?

São tantas as músicas de que gosto, mas amo as das festas juninas, pois elas me fazem lembrar meu pai, que adorava Luiz Gonzaga. Mas não posso deixar de dizer que a bossa nova me comove, sobretudo Wave, de Tom Jobim. A sonoridade dessa música tem uma leveza ímpar. Wave não é linda?  Simples, linda, clara… Ótima pra sonhar de frente ao mar! Luiz Gonzaga me faz visitar o passado e Wave me faz me projetar para o futuro, que se inicia exatamente a cada momento!

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Márcio Correia

Graduado em Psicologia e Inglês, pela UMHB, nos EUA, e com cursos de aperfeiçoamento em gerenciamento e marketing feitos ao longo de sua vida, Márcio é um entusiasta e adora gente, cultura, festas e novidades. Já morou nos EUA por muitos anos e sempre que pode encontra novos lugares para conhecer. Acumula boas experiências nas áreas da música, moda, design, arquitetura e organização de eventos. Já foi colunista em um jornal local e atualmente organiza eventos sociais e empresariais, além de ser professor de inglês e assinar a coluna OCASIONAIS para o Portal ConceituAdo

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